quarta-feira, 2 de julho de 2008

Suzy e Malô...

Continuação do Cap.II abaixo

João Branco, um estudante magricela e sardento, que também atendia por Sinclair Lewis e defendia o mesmo ponto de vista de Galileu, reconduziu a conversa, que tendia a se desmoronar com o aparte de Chico:
- Estou com Galileu no tocante à mulher, que a meu ver, fora a procriação da espécie, não possui outro mérito qualquer.
- Você é um louco, Branco!... – disse Júlio Prado, cortando a dialética do sardento.
- Discordo do seu ponto de vista, Branco, mas vamos que a mulher fosse totalmente estúpida como vocês advogam e só tivesse a seu favor a propagação da espécie, não seria tudo?... – inquiriu Narciso Vargas, um paraibano grandalhão, moreno e admirador de José Lins do Rego e José Américo de Almeida e que se fazia respeitado pela sua oratória.
- A fim de aumentar as desgraças do mundo?... – indagou Galileu.
Oscar Duarte, um tipo gozador, que não levava nada a sério, nem mesmo o seu curso de Direito, quebrou a seriedade da palestra, dizendo, a limpar os óculos na fralda da camisa:
- Eu, nestas questões relacionadas com muié, fico com aquele filósofo popular que disse com muita precisão que “...se Deus fez algo melhor que a mulher sobre a face da terra, guardou-a muito bem guardado para si mesmo”. Não posso crer que exista algo melhor do que aquele pedaço de couro peludo e mijado que ela carrega entre as pernas.
A sala quase vem abaixo com a tirada sarcástica do Duarte e Cabeção, acrescentando algo à pilhéria, disse em tom moleque:
- Até eu, que sou mais bobinho, por um pedaço de carne mijado sou capaz de dizer que a mulher é a suprema razão da vida.
Novas risadas.
Galileu, novamente tomando as rédeas da conversa, disse em tom sério:
- A mulher, pensando bem, é a corda dissonante da natureza!...
- UUU!... – fizeram os defensores do belo sexo, que não estavam dispostos a discutir os méritos do assunto, deixando que Galileu filosofasse sozinho e esse, por sua vez, não achando resistência por parte dos seus contendores, retirou-se da sala arrastando após si uma leva de jovens, que ansiosos queriam beber mais e mais de suas doutrinas pessimistas. E Malô, ao cabo de alguns minutos, retornou ao salão festivo, onde os primeiros pares começavam a dançar.
Cabeção, no palco, imperava, com sua ginga de malandro carioca, a cantar um samba em voga. Galileu, em volta de uma mesa, apregoava sua filosofia. Mário Neto, que há muito vinha de olho em Érika, uma linda germânica, que cursava jornalismo, tentava conquistá-la. Oscar Duarte (famoso depois da piada, que andava de boca em boca), saíra dançando com Ester, enquanto Malô, após trocar algumas palavras com o professor Moraes, que vinha entrando acompanhado pela esposa, aproximou-se de Suzy e Dona Cleyde, que foram perguntando à queima roupa:
- Malô, quem é essa menina que dança com o Duarte?... É irmã dele, Dona Cleyde: a caçula, chama-se Fernanda. Tem mais duas do mesmo porte dessa – informou o acadêmico.
- Que belo rosto tem ela, não achas, Malô?...
- Oh, sim – fez o moço, desinteressado.
Até parece a Madmoiselle Rivéri de Ingres – acrescentou Suzy, com ar de quem manja de artes plásticas.
- Deveras!... – disse dona Cleyde.
- E como dança bem – obtemperou Renato, que tinha fumaça de bom passista.
Malô, em seguida, tirou Suzy para dançar, enquanto Renato Amarante e Dona Cleyde saíram valsando e causando inveja a quase todos os presentes no salão.
Cabeção, no palco, imperava, cantando uma valsa dengosa, que fazia fremir os corpos presentes.
O calor na sala era intenso e Suzy, após alguns passos desajeitados, sugeriu:
- Como faz calor, não seria melhor se fôssemos conversar lá onde estávamos?...
- Você acha?...
- Oh, sim, está quente – disse a moça, comprimindo o busco perfumado e morno contra o peito magro e cabeludo do estudante.
Logo em seguida, após a parte, tomou o rapaz a mão da menina e a reconduziu para os fundos do salão, onde sentaram em volta de uma mesa e iniciaram uma palestra, que terminou em namoro.

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