quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Suzy e Malô...

Evening Tango by Trish Biddle
Suzy e Malô numa receita de amor eterno (VI)

Continuação do capítulo V abaixo...


Sorriu o acadêmico meio vaidoso e disse em seguida:

- A Zeus...

- Sempre com seus gregos, não?...

- Não é bem não gostar dos gregos, apenas não gosto ou não entendo a sua mitologia, o que dá no mesmo.

- Você mesma me parece uma deusa grega – disse Malô, declinando a cabeça no ombro da moça.

- Qual delas?...

- Não sei qual delas, talvez Afrodite, a deusa do amor.

- Afrodite não era romana?...

- Sabe que no momento não me recordo bem se era grega ou romana?...Mas de qualquer maneira, não tem isso a mínima importância, o que interessa mesmo é você – puxou-a e apertou-a de encontro a si mesmo.

- Será que ela era loira?...inquiriu Suzy;

- Não sei, talvez...

- Quem sabe se não era híbrida, meio romana, meio grega...

- Anrã!... – fez o rapaz, como que a pôr termo à conversa.

- Então, por Zeus, continue a leitura – disse Suzy, consertando os cabelos loiros, que se haviam espalhado.

- O segundo capítulo está muito ruim, convém deixarmos de lado, vamos conversar.

- Nada disso, vim aqui para ouvir a leitura do livro.

- Você é intransigente – não?...

- Vamos! Seja bonzinho, leia, leia!...

Malô em seguida beija-a no busto, que aparecia sob o longo decote do vestido vermelho em forma de V e iniciou a leitura do segundo capítulo.

Ao término da leitura, a moça deixando transparecer a sinceridade de que se achava possuída, disse:

- Estão ótimos esses dois capítulos. Vejo neles fulgurância do melhor Graciliano Ramos.

- Você me deixa meio vaidoso e ao mesmo tempo humilhado, comparando-me ao velho mestre de Quebrângulo. Ou pretende com isso que eu prossiga escrevendo estas bobagens?...

- Minha opinião foi sincera, sem a mínima intenção de lisonjeá-lo.

- Ótimo!... Ótimo!...

- Rogo-lhe que prossiga, esse livro, por certo, vai abrir-lhe as portas da fama.
- “Vamos a veire” – disse o rapaz, imitando um sotaque português, abandonando os originais sobre a mesa e convidando a moça a olhar seus livros em uma estante que ficava entre dois sofás vermelhos.

A principio mostrou-lhe alguns poemas inéditos, que pretendia publicar em livro. A letra do samba “Os independentes”, uma coleção das obras completas de Dostoiewisky, com alguns volumes bem sublinhados de vermelho, demonstrando sinal de contínuo manuseio. Depois, tirou de uma prateleira um exemplar dos seus “Os Humilhados”, que continha uma esquelética paisagem na capa ferruginosa, sentou-se no sofá, dizendo:

- Vou autografar um exemplar do meu livro com uma dedicatória bem bonita:

- Obrigada, você é um amoreco!...disse Suzy, sentando-se ao lado do escritor, que, tomando da caneta, escreveu na sobrecapa do livro, com letra grandalhona e redonda:

“Para a graciosa noivinha Suzy, com sua boca de pitanga e seus cabelos de sol”.

A moça, ao ler a dedicatória lisonjeira, abraçou o namorado pelo pescoço, cobrindo-o de beijos, como que a retribuir o preço da dedicatória. O rapaz abraçou-se a ela e se possuíram pela primeira vez. Enchendo a sala de gemidos, suspiros e ais de amor.

Suzy, após o ocorrido, muito sonolenta, penteou-se em frente do grande espelho e perguntou com um sorriso enigmático:

- Benzinho, o que fizemos?...

- Amor, minha querida – respondeu o rapaz, também a sorrir.

- Tenho medo de haver concebido um beibe – disse a moça apertando o baixo ventre. Tenho um medo danado da boca do povo.

- O povo que se lixe, minha querida. É alto tempo de nos desprendermos desses conceitos bestas. Nada nos interessa do que alguém venha a pensar ou dizer a nosso respeito.

- Papai,quando souber o que aconteceu, será capaz de me matar.

- Não vai matar coisíssima nenhuma. Ele acabará por nos entender.

- Será, benzinho?...

- Oh, sim, você verá!... – disse o rapaz.

- Em parte, estou de acordo com você – disse Malô – o seu medo até certo ponto é justo. Mormente num país semi-bárbaro como o nosso, onde a religião monopoliza e sufoca toda a idéia de liberdade, que foge aos seus conceitos.

- Isso é verdade – disse a moça, pensativa.

- É preciso que o nosso povo se livre o quanto antes desses falsos padrões e passe a viver de maneira mais civilizada.

Continua...

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